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A extrema importância da nutrição na gravidez – os primeiros 1000 dias de vida! - parte I

Com cada vez maior atenção sobre si, o estudo dos efeitos da nutrição antes e durante a gravidez, é uma área que deve ser intensamente esclarecida e divulgada, pela importância que tem na saúde de cada indivíduo adulto e dessa forma nas sociedades.

Sabe-se que a nutrição afeta diretamente a saúde do bebé, mas a ideia que paira, é a de que esta importância se relaciona, apenas, com a influência sobre o peso da mãe e o risco de obesidade para o filho. Nem as grávidas, nem os profissionais de saúde e mesmo o governo, reconhecem ou valorizam, ainda, o valor real da nutrição nesta fase da vida. É importante sensibilizar e esclarecer todos os interessados para a importância da nutrição antes, durante e depois da gravidez, em especial nos primeiros 1000 dias de vida, que inclui a gravidez e os dois primeiros anos de vida da criança.

Teoria de Barker

comida-saudavelEste conceito, de que a nutrição perinatal tem um potente efeito na saúde futura de qualquer indivíduo, foi originalmente postulado por David Barker (médico e professor de epidemiologia britânico) na década de 80, como a hipótese da Programação Metabólica ou “o efeito fetal das doenças do adulto”. Embora antes, já Ghunter Dorner em 1974 tenha estabelecido relação entre “nutrição perinatal e doença futura”, foi Barker que, ao lançar esta ideia controversa, fez com que algumas centenas de estudos tenham sido realizados sobre esta matéria. Segundo a teoria de Barker, o feto seria programado durante o desenvolvimento intrauterino, principalmente por fatores ambientais, como a nutrição, que influenciariam o seu metabolismo para toda a vida, justificando-se assim a origem de algumas doenças crónico-degenerativas da vida adulta. Todos os desequilíbrios nutricionais ocorridos no útero e na vida pós-natal precoce, desempenham um papel essencial no desenvolvimento de doenças metabólicas crónicas no adulto, como obesidade, hipertensão, doenças cardiovasculares, diabetes tipo II. Ou seja, o que “comemos” nos 9 meses de vida dentro do útero, pode determinar se desenvolveremos hipertensão aos 30, ou diabetes aos 40, ou se teremos um ataque cardíaco aos 55. O que em suma esta teoria nos diz, é que a má nutrição, e outros fatores ambientais nefastos, como o fumo do tabaco, o álcool, exposição a tóxicos, são os grandes condicionadores de um futuro saudável na vida de qualquer indivíduo.

Epigenética

Deve neste momento estar a questionar-se, então se a nutrição tem todo esse poder, os genes não mandam nada? Claro que sim! Mas sabe-se hoje que, apesar do genoma definir as características anatomofisiológicas do indivíduo, são as alterações provocadas, mais uma vez pelo fatores ambientais, que influenciam em maior grau, aquilo que é passado através da hereditariedade de pais para filhos. O nosso genoma responde de forma dinâmica aos efeitos do ambiente (alimentação, stress, etc.), que ativa “interruptores” químicos que irão regular a forma como os nossos genes se expressam. Ao estudo destes fenómenos, chamamos de epigenética, referindo-se a uma série de sinais bioquímicos que alteram a estrutura e função genómica, sem alterar a sequência do ADN.

A persistência destas alterações epigenéticas pode resultar em modificações morfológicas, metabólicas e imunológicas ao longo de várias gerações, modulando a saúde, a morbilidade e mortalidade, por doenças que se manifestam normalmente na idade adulta.

Estes efeitos não afetam apenas o risco de obesidade e doenças cardíacas ou diabetes, também exercem grande influência sobre a função neurológica, função imunológica e risco alérgico. É também fundamental a fase seguinte, já fora do útero, os dois primeiros anos de vida, que inclui a influência da alimentação materna sobre a amamentação.

Esta modulação nutricional com efeito de programação, sugere que as experiências nutricionais precoces, são responsáveis por formarmos crianças saudáveis, que serão os adultos de amanhã e o futuro das sociedades, influenciando-as tanto a nível social como económico.

Os primeiros 1000 dias de vida

bebeQuando o seu filho nasce só quer que seja saudável, e irá fazer de tudo para que seja feliz, certo? E faz muito bem! Escolher uma boa escola, querer que tenha experiências felizes, música, jogos, boas brincadeiras, muito amor, boa alimentação. São tudo fatores que irão contribuir de forma decisiva para um futuro promissor. Estes primeiros 1000 dias de vida, onde está incluída a gravidez, são fundamentais na prevenção de determinados problemas de saúde, na construção e desenvolvimento do sistema nervosos e imunológico e até para influenciar a forma como o seu filho se irá alimentar em adulto. Ainda durante a gravidez, a nutrição materna pode influenciar o olfato e o paladar do bebé, através do líquido amniótico. E o stress durante a gravidez pode originar um bebé com um QI menor.

Os 720 dias seguintes, tornam-se mais importantes no desenvolvimento das funções cognitivas, onde o bebé irá apurar as suas potencialidades intelectuais, motoras, etc. O ambiente, exerce um estímulo essencial, na maturação do cérebro da criança neste período, e não só o ambiente nutricional, como temos visto até aqui, mas ao nível das experiências físicas e sociais. Quanto mais e mais variados forem os estímulos que a criança experimenta, maior será o número de ligações entre os neurónios, o que significa um maior nível intelectual. Isto não quer dizer que deve ensinar o seu filho a ler aos 3 anos, mas que deve oferecer-lhe a possibilidade de brincar, experimentando diferentes materiais, deixá-lo sujar-se, brincar com as outras crianças, brincar nos parques, ter livros por perto, experienciar a música, etc. Tenho a certeza que irá dar o seu melhor. E com a comida, está preparado para oferecer o melhor da nutrição, para garantir que o seu filho, seja um adulto saudável, inteligente, diligente socialmente e feliz?

Não é a primeira vez que vejo crianças muito pequenas a comer fast-food, goludices, demasiadas gorduras, a ser-lhes permitido negligenciar os vegetais e as frutas, substituindo-as por bolachinhas e iogurtes “especiais” cheios de açúcares… ai é só hoje (reconhece esta expressão?)! Mas estas experiências alimentares em idades tão tenras, podem prejudicar bastante a saúde da sua criança e os seus gostos alimentares futuros. Quando escolhe a melhor alimentação para o seu filho está a dar-lhe uma boa educação, tal e qual como quando lhe ensina a diferença entre o bem e o mal ou a passar-lhe os seus valores e princípios, é um ato de amor. Por isso, a melhor forma de o fazer é conhecer a nutrição, os nutrientes e os alimentos, para poder escolher o melhor para si e para a sua família.

Nas próximas publicações iremos abordar as necessidades nutricionais da gravidez, falar dos nutrientes a que se deve dar maior atenção, e formas de elaborar menus saudáveis para garantir uma excelente nutrição nesta fase da vida. Fique atento.

P.S. Este detalhe de falar no masculino, não é uma gafe, já que falo na gravidez, deveria supostamente dizer, atenta ou preparada, não é? Mas não é só a mulher que deve preocupar-se com estas questões, uma vez que também o pai, dá um enorme contributo positivo, antes da gravidez, se se alimentar de forma saudável. Também ele irá passar aos filhos as alterações epigenéticas que correm pelos efeitos dos fatores ambientais a que está sujeito, no momento da conceção. Depois, existe a questão da educação alimentar, que já não é, só responsabilidade da mãe, como noutros tempos. Assim estejam atentos e façam o vosso melhor!

Até breve.

 

Referências:

- Barker, D. J. Fall, C. H. Fetal and infant origins of cardiovascular disease. Archives of Disease in childhood1993, 68: 797-799.

- Castro, Rita de Cássia Borges. O que é epigenética e qual sua relação com a nutrição? 25/08/2011 - http://www.nutritotal.com.br/perguntas/?acao=bu&id=634&categoria=22target=_blank

- Rêgo, Carla. Da responsabilidade profissional à responsabilidade social ou o que o pediatra deve conhecer sobre obesidade e programação metabólica. – CCA Hospital CufPorto. Faculdade de Medicina da Universidade do Porto. CINTESIS. 0873-9781/11/42-6/XCVIII. Acta Pediátrica Portuguesa. Sociedade Portuguesa de Pediatria.

- Devincenzi, M. U., Ribeiro, L. C., Modesto, S. P., Campos, K. A., Sigulem, D. M. COMPACTA NUTRIÇÃO – Nutrição nos dois primeiros anos de vida. São Paulo: Editora de Projetos Médicos EPM, 2004.

- I. Darnton-Hill. C. Nishida. W.P.T. James. A life course approach to diet, nutrition and the prevention of chronic diseases. - http://www.who.int/nutrition/publications/public_health_nut2.pdf?ua=1



Inserido em: 2014-05-12 Última actualização: 2015-04-07

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Autores > Cláudia Maranhoto
Nutrientes Essenciais